segunda-feira, 12 de julho de 2010

A história do carro de 500 dólares que venceu corredores do WRC

Roubado discaradamente de:

http://www.jalopnik.com.br/galeria/historia-do-carro-de-500-dolares-que-venceu-corredores-do-wrc

Q nem um amigo meu diria... automobilismo foi, é e será esporte de rico...

mas para toda regra existe a exceção!

A história do carro de 500 dólares que venceu corredores do WRC





O automobilismo profissional é um lugar difícil e frio. Se você quer brigar com os cachorros grandes, não dá pra construir um carro na garagem da mamãe e aparecer na pista, certo? Errado. Foi exatamente isso que esse cara fez, e esta é sua história.

Esta é a história de Bill Caswell, um cara que comprou uma lata velha por 500 dólares na Craigslist e correu contra carros de rali que custam mais de 400.000 dólares no Rali do México, no começo deste mês. É a história de um cara que tinha um maçarico, um monte de cartões de crédito e um tempão livre, mas não tinha patrocinadores ou economias. É a história de um cara que aprendeu sozinho como construir um carro capaz de ser homologado pela FIA sem muita experiência anterior, porque ele queria usar o dinheiro da construção com pneus. É a história de um entusiasta que dirigiu um balde de ferrugem até o terceiro lugar em uma corrida da FIA.
Acima de tudo, esta é uma história sobre pilotagem.

Bill Caswell, um fã de corridas desempregado de Chicago entrou na etapa mexicana do WRC com um BMW 318 1991 que encontrou no Craigslist. O carro custou 500 dólares. Um ano atrás, Caswell decidiu que iria correr no Rally America. Dois meses depois, bateu o carro e estourou um motor apenas cinco minutos depois do início de sua primeira corrida. Quatro corridas depois, ele encontrou uma brecha no regulamento da FIA que o permitia participar do mesmo evento que Ken Block e Kimi Raikkonen usando seu carro de 20 anos.

Nota: Caswell é meu amigo. Temos uma longa história juntos em projetos estúpidos e sem sentido. Na maioria das vezes vamos a bares próximos às pistas e ficamos conversando sobre as coisas legais que eu gostaria de fazer se tivesse tempo. Que são as coisas que ele vai e faz.

A história da entrada de Caswell no WRC é uma história estranha: ele entrou na maior corrida de sua vida sem equipe, com um carro sem testes que teve o motor trocado uma semana antes - e com câmbio de ferro-velho. Um carro que ainda estava coberto com a lama dos ralis anteriores ("eu teria lavado, mas precisava arrumar o carro") e uma van alugada. Seu copiloto, um gênio do Rally America chamado Ben Slocum, não passou mais de cinco minutos com ele antes da corrida. E não fez isso por ser estúpido, mas porque não tinha recursos. Ele queria correr de rali e essa era o único jeito de fazer acontecer.
Por mais incrível que possa parecer, eles terminaram em terceiro na classe.

O WRC no México foi há duas semanas. Eu não pude acompanhar, mas graças às maravilhas da tecnologia moderna, recebia continuamente as novidades de Caswell. Inicialmente eu ia escrever uma história resumindo o feito, mas os emails - como o olhar do cara sobre como ele estava indo - se mostraram necessários. Aqui eles estão. Aproveite.

(Nota: esse é um post longo. Se tiver pressa, veja os vídeos e leia a parte em negrito. A ênfase/negrito é minha, não de Bill)



Parte Um: primeiro, quebramos muito
A história veio chegando aos trancos. A primeira coisa que recebi dele depois de um silêncio de uma semana:

"Acho que estou em segundo. Mas saí da pista e estourei o amortecedor traseiro esquerdo. Acho que posso soldá-lo, mas um serviço como este leva meia hora."

Animador, não?




Ficou mais louco daqui em diante. Não recebi ligações, nem atualizações. Só emails aleatórios. Eles se tornaram mais longos e mais detalhados a medida que o tempo passou. O vídeo acima foi feito com o telefone de Bill na cerimônia de abertura do rali. Apareceu na minha caixa de emails durante o fim de semana, sem aviso algum.



"Ah, sim. Os guardas fecharam a highway e as ruas da cidade, assim pudemos ir de uma cidade à outra rapidamente. Eu tenho que contar: rasgar a cidade com pneus de rali enquanto os guardas mexicanos tentam acompanhar você é algo indescritível. Sem falar que as ruas são delineadas somente por pessoas ao longo de 35 quilômetros. Foi incrível. Cheguei lá atrasado para o reconhecimento e tive que arrumar as notas da pista com o campeão peruano de rali. Cara, foi legal, mas as notas estavam em espanhol, ou algo assim. Então os "e" eram direitas e os "d" esquerdas?
A FIA instalou um GPS enorme no carro. Se parássemos por 10 segundos sem mandar uma mensagem de "estamos bem" e eles não ouvissem nada durante 30 segundos, enfiariam um helicóptero médico na nossa cola e o estágio seria cancelado. Um tubo do radiador estava vazando durante a inspeção técnica e quando eu estava mexendo nele um dos fiscais notou. Disse a ele que havia transbordado e era só água."



Perguntei a Bill por que ele insistia em passar pelos espectadores com o motor cortando giros. Ele disse: "Cara, eu não me importo se custar uns décimos de segundo. Isso enlouquece os fãs."

"A bomba de combustível avariou a três estágios do final. Tirei a bomba, dei uns tapas, peguei emprestado uma faca de um policial e cortei um pedaço qualquer da proteção do cockpit para inverter o fluxo e dei umas pancadas até que ela voltou a funcionar. Mas estávamos uns poucos minutos atrasados. Sentamos o pé e nos recuperamos. Ia conseguir fazer as outras duas, mas me perdi e perdi o dia."



"Tenho quatro horas para dormir, o maior tempo em uma semana. O carro está perfeito. A bomba de combustível foi consertada no acostamento. Consertei a barra estabilizadora traseira. Coloquei pneus novos. Fiz novas travas para o capô com um soldador emprestado. O suporte da transmissão ficou preso só por um parafuso e uma porca rosqueada pela metade. Tive sorte.
Depois de consertar a bomba de combustível, chegamos atrasados ao próximo estágio. Os fiscais estavam meio como se dissessem "os fãs acham que o estágio acabou, estão indo embora, há picapes no meio da pista. Vocês não podem correr". Tive que dirigir a 25 km/h, enquanto era cronometrado por um estágio em que, normalmente, estaria a 160 km/h. Como se não fosse bastante, o maldito Kimi Raikkonen jogou seu carro de um barranco e um guincho-plataforma estava bloqueando a estrada para puxar o carro para fora da vala. Quando o caminhão finalmente terminou o trabalho, terminamos o estágio.
Precisei recuperar o tempo e mais tarde me disseram que passei por um guarda com o carro a milhão mas nem tirei o pé. Alguém disse que os federales fizeram um tipo de bloqueio nas estradas mas nem vimos luzes ou algo do tipo (algo diz que essa história tem mais detalhes. Se você topar com Bill por aí, pague uma cerveja e peça para ele te contar os detalhes)."



Parte dois: o cara fez um bundalelê pra nós?
"Estou mal, mas é por que fui o último a chegar no parque fechado e o único espaço livre era junto com os carros milionários do WRC. Estacionei a lata velha junto com Loeb, Hirvonen e todos os caras. Só podia imaginar o que os outros caras pensaram quando chegaram lá: "Caramba, eu não era nem nascido quando esse carro foi lançado". Um outro cara da FIA chegou, me cumprimentou com um aperto de mão e está voltando para pegar um autógrafo. Sério.
Ele disse que há muito tempo não via um carro de tração traseira em um evento profissional como este. Muito menos um carro competitivo... "Mais ou menos", respondi. Isso é muito legal.
Inacreditável. Teve um estágio em que eu desci um morro a uns 160 com o carro de lado por cerca de 100 metros.
Incrível.
Hora de detonar esses Evos. Há um Mitsubishi em segundo, em terceiro e um WRC de cinco anos em primeiro. Esses foram os carros que terminaram todos os estágios ontem. As estradas são um martírio. É como andar a 160 sobre tábuas de lavar roupa.
Ah, me mandaram um bundalelê ontem. Um cara entrou meio metro na pista, virou de costas e baixou as calças. Que m****.
Está no vídeo. Assim como Slocum me repreendendo por mandar um "joia" para os fotógrafos e fãs enquanto entrava de lado na curva com a traseira deslizando. Eu achei que tinha ficado incrível.
Conto mais outra hora."



Esse foi o email que fez meu coração sair pela garganta.

"Acabei de fazer o primeiro estágio do dia. Trinta quilômetros de loucura. Passei por esse trecho a 110-120km/h com milhares de pessoas delineando as ruas. Saindo de uma curva havia uma ponte que alguém esqueceu de indicar nas notas. Mas é uma parte plana, de concreto, com uns 5 metros de largura e nossa trajetória ia direto à borda. Slocum disse no microfone "já era". Parou de ler as notas e se preparou para a pancada. O rio lá embaixo tinha pedras do tamanho de fuscas. Areia e cascalho na curva, parecia que os espectadores haviam colocado propositalmente. Não acertei o ápice da curva por um metro e meio, mais ou menos. O carro saiu de frente, a saída da curva era a entrada da ponte. Endireitei e pisei fundo. 60 ou 70 por hora. Metade do carro ficou fora da ponte. Estava claro e eu pisava fundo esperando que o pneu esquerdo e o diferencial nos tirassem daquela. Saímos tanto da ponte que o braço da suspensão entortou uns cinco ou dez centímetros. Quase todo o lado direito do carro estava pendurado fora da ponte. Agora na fila para o segundo estágio. Mais seis para o final.
Eles simplesmente encerraram o estágio! Não sei por que, mas talvez por acidente. Block, Sordo e mais alguém andaram forte no último estágio. Fomos batidos pelos dois Evos, mas só por 45 segundos além dos 23 minutos. Eles têm turbos.
O braço da suspensão tinha uma fissura de uma polegada onde bateu na ponte. Foi o que nos salvou - ela trouxe o carro de volta para a ponte. O carro beijou a ponte a dez centímetros do parafuso que prende o subchassi na carroceria."



Alguns emails eram mais sobre o mesmo assunto. Mas eram encantadores assim mesmo.

"Corri atrás de um soldador e soldei a torre do amortecedor na noite passada. Mas no primeiro estágio o encaixe do amortecedor estourou tudo. Então a ventoinha auxiliar superaqueceu e derreteu os fusíveis. No terceiro estágio não percebemo que havia um banco de areia à frente (nossas notas estavam em português ou algo parecido) e o acertamos em cheio a uns 130 km/h. Ele estourou como se fosse um tijolo contra um muro e acabou quebrando o calço do motor ao meio.
Mas o salto foi incrível. Depois eu saí um pouco mas recuperei o traçado. Algumas crianças jogaram pedras na estrada enquanto eu passava e uma delas furou meu tanque de gasolina, o que me fez perder quase meio tanque em 24 km no estágio seguinte. A melhor parte foi quando eu perguntei quão grande havia sido o estrago e os fiscais de prova apontaram o vazamento e uma porção de gasolina. Eu sabia que estávamos ferrados, mas disseram que poderíamos começar o estágio e foi o que fizemos. Remendei o tanque com o que tinha no porta-malas - adesivos de vulcanização a frio e silvertape - a cinco metros da largada com os fiscais assistindo tudo. Não tinha tempo para consertar direito, então os cinco estágios do dia seguinte seriam corridos com o adesivo vulcanizado. Quase terminei o resto do dia. Fiz um conserto de 10 minutos antes de tirar o carro do parque fechado e ainda precisava colocar pneus novos. Só mais três estágios amanhã. Aparentemente o antigo corredor do WRC ou o Evo quebraram na etapa final, o que significa que volto na terceira posição."



Parte três: nós podemos ou não estar dentro das regras
"É isso aí. O parque fechado. Eles trancam seu carro e você não pode trabalhar nele durante a noite. Mas você pode tirá-lo para reparos durante 45 minutos. Então antes que começassem a contar o tempo me enfiei embaixo do carro e desmontei o calço do motor com a incrível caixa de ferramentas do porta-malas. Aí pude instalar a nova peça e depois tirei o carro do parque fechado só para trocar os braços. Funcionou. Agora temos um braço de aço e um novo calço. O tanque de combustível continua remendado com adesivo de vulcanização e silvertape. Não era hora de esvaziar o tanque para consertar. Espero que continue assim hoje.
A propósito, é incrível correr com a BMW aqui e pegar os pequenos Peugeot WRC usando um chassi que não corre desde a época do chassi Prodrive das M3 E30. A festa desta noite promete. Será em outra cidade, em alguma antiga ruína mexicana, de acordo com os caras que correram no ano passado."

O vídeo abaixo mostra dois fãs falando com Bill e descrevendo como o BMW passou por eles no estágio chamado "El Cubilete". Os clipes do telefone de Bill são sempre iguais, eles acabam com uma imagem de seu próprio rosto impressionado, como se dissesse "Você acredita nisso? Sou eu!".



"Ok, eu sei que ler isso é, provavelmente, ficar velho. Mas, cara, eu estou tomando café vestindo uma jaqueta da BMW e uns dez caras da mesa ao lado viram-se para mim e perguntam: "você é o piloto do BMW?" Então tirei fotos com cada um deles no restaurante. Disseram que gostam de BMWs mas estão com o clube mexicano do Dodge. Adoraram o fato de eu ter vindo sem equipe e feito meu próprio carro. Eles disseram que eu devo ser meio mexicano por causa do modo que conserto meu carro. Isso é um elogio, não?"

"Entortei as travessas dianteiras quando bati em um banco e destruí o protetor de cárter, que é apoiado na barra anti rolagem. E uma parte de mim é doente e queria ver até onde eu poderia punir essa coisa antes que ela se partisse ao meio.
A propósito, alguém quer me dar uma inscrição e passagens para outro rali? Aparentemente viram meu navegador gritar comigo enquanto eu dava autógrafos e tirava fotos até o último minuto possível antes de entrar em um carro e partir. Slocum e eu estávamos fazendo as contas. Dei autógrafos por três horas só no domingo. Ele acha que deve ter sido 1500 ou 2000 autógrafos e talvez 1000 ou 1500 fotos. Umas duzentas pessoas gritando "Caswell! Caswell!" Terminamos em terceiro na classe. Não sei como cheguei aqui. Loucura."



É, Bill... loucura. Você, meu amigo, é um verdadeiro Jalop. Você é o piloto insano do dia. Talvez o piloto insano do mês. Quem sabe até o piloto mais insano do ano. E você é corajoso pra caramba. Na próxima vez que você cair de paraquedas e detonar a galera da FIA, dê um grito pro pessoal do Jalopnik. Traremos umas margaritas e brindaremos a você.

10:39:17 AM Bill Caswell: Burning Down the House parece ter sido a trilha sonora dessa aventura estranha. Éramos a única "equipe" ouvindo música durante a manutenção. Eu acordava e a primeira coisa que fazia com meus 30 minutos era escolher as músicas, porque você não pode trabalhar sob o sol do México sem música. Você deveria ter visto a multidão. O piloto em um macacão consertando o carro enquanto Talking Heads tocava no rádio e o navegador gritava durante 20 minutos. Cheguei a um ponto que comecei a rir sozinho enquanto colocava a roda de volta no carro - eu estava de verdade do WRC com meu carro favorito e sem equipe, arrumando o carro sozinho?

10:41:28 Bill Caswell: mesmo que eu não corra nunca mais eu estaria feliz. Foi épico. Você deveria ter ido lá.

A classe em que eles correram é chamada Rally America, mas não tem nada a ver com o campeonato de mesmo nome dos EUA. Você pode ver os resultados (em PDF) em www.rallymexico.com. Caswell e Slocum obtiveram o tempo total de 5:29:38.4 com as penalidades já descontadas, suficiente para um terceiro lugar em sua classe e um hipotético 23º lugar geral, caso estivessem competindo de verdade no WRC.
Vinte e cinco pilotos competiram na classe do WRC no Rally Mexico. Caswell e Slocu não somente competiram com carros de 400.000 dólares. Eles derrotaram esses carros.



Crédito das fotos: Jordi Saiz, um cara generoso e talentoso, Ruta Rally, Sam Smith e Bill Caswell